Aconteceu no último domingo, dia 15 de
julho de 2012, a quinta edição do que é provavelmente o principal
festival de Doom Metal brasileiro, o Eclipse Doom Festival. Pela
primeira vez em São Paulo (anteriormente o festival acontecia na
região Sul do país, onde a cena sempre foi muito bem representada),
foi realizado desta vez no Manifesto Bar, um dos mais tradicionais
bares de rock de Sampa, e que fica no Itaim Bibi.
A CASA E O EVENTO:
Pra quem não conhece (como eu até o
dia), o Manifesto é uma casa de médio porte, bom para eventos como
este, com muitos lugares pra sentar pra quem apenas quiser curtir os
shows enquanto “toma umas” com os amigos, mas ainda com espaço
pra quem quiser assistir de perto do palco. O acesso é fácil, com
opções de ônibus, ou pelas estações Cidade Jardim da CPTM (mais
próxima), ou Faria Lima do Metrô (uns 20 a 30 minutos a pé).
A entrada era de apenas R$15,00, nos
ingressos antecipados via TicketBrasil, e de R$20,00 na porta.
As bandas a se apresentarem foram O
Mito da Caverna, Mortarium e HellLight, mas o evento contaria também
com a apresenção da Les Memoires Fall, de São José dos Campos,
que não pôde comparecer devido a problemas de saúde de alguns
membros. O evento também foi a “festa de lançamento” do CD
Doomed Serenades, a 1ª coletânea brasileira voltada somente para o
Doom Metal, e teve o apoio da União Doom Metal Brasil, responsável
por esse lançamento.
Antes de falar sobre os shows
individualmente, é preciso dizer que, por um lado, embora a acustica
do Manifesto tenha me parecido boa e a altura dos intrumentos
estivesse bastante confortável (nem saí do evento com os ouvidos
zumbindo), por outro lado, as guitarras em todas as apresentações
pareceram baixas e um pouco emboladas, principalmente nos riffs mais
graves, sendo que em muitas partes ficaria impossível entender o que
estava sendo tocado, se não fosse o baixo. Exceto por isso, tudo
correu muito bem e o produtor, Daiton Arkn, está de parabéns pela
organização e pela qualidade do evento, além da ousadia em
trazê-lo para Sampa.
OS SHOWS:
O Mito da Caverna:
Cheguei ao Manifesto enquanto a banda O
Mito da Caverna abria a noite, por volta de 18:50h. Embora a banda
denomine seu estilo como “Grindcore Morto”, eu diria que o que
eles fazem é, na verdade, um Sludge Doom com muita influência de
Drone. O som é excêntrico, barulhento, pesado, experimental, usando
dissonâncias, muitos ruídos e feedback de guitarra. Os vocais do
Augusto Miranda são nervosos e o cara urra seus pulmões pra fora
enquanto a banda alterna momentos de puro Drone, quando o som é mais
introspectivo e pode não agradar tanto quem não é fã desta linha,
com outros momentos do Sludge mais sujo, onde o som se torna mais
empolgante e próprio pra banguear. O Mito tocou apenas duas músicas
em cerca de meia hora, sendo que, entre as duas, houve uma pausa onde
o vocalista fez um discurso de alguns minutos, a respeito das
desigualdades sociais e da manipulação da mídia.
Vale ressaltar este forte apelo social
nas letras e discursos da banda, fugindo bastante dos temas mais
comuns do meio Doom, normalmente mais pessoais. A banda contesta
todas as formas de preconceito, o fascismo e o direitismo político,
e parece já ter conseguido algumas inimizades nas cenas Core, das
quais ela é oriunda, devido a essa ideologia.
A postura da banda foi um tanto tímida,
talvez por se sentir deslocada ao se apresentar pela primeira vez num
evento exclusivamente Doom Metal, com os guitarristas e o baixista
tocando a maior parte do tempo virados para a bateria e de costas
para o público. Somente o vocalista demonstrou uma postura mais
agressiva e à vontade, se movimentando bastante pelo palco.
Pra quem curte o Sludge, o Drone e os
lados mais barulhentos do Doom, O Mito da Caverna é uma banda
obrigatória. Pros que não conhecem a linha, com certeza, será uma
experiência diferente assisti-los ao vivo.
Setlist:
1 - A Conquista da Colina (parte final
da música)
2 - Anticapital (versão de uma música da banda
Assück)/A Conquista da Colina
Mortarium:
A segunda banda a subir no palco foi a
Mortarium, do Rio de Janeiro. É inevitável ressaltar que a banda é
somente formada por mulheres e, isso, por si só, já chama a
atenção. E o que as destaca ainda mais é o fato de que o som delas
não tem nada de angelical e foge de todos os estereótipos possíveis
que se atribuiriam a uma banda feminina. Nada de teclados, nada de
vocais líricos, as meninas mandam um Death Doom na linha mais
pesada, de andamentos médios na maioria com algumas levadas mais
quebradas da baterista Julie Souza, alternando os vocais guturais da
guitarrista Tainá Rodrigues com os vocais limpos da baixista Vivi
Alves, com linhas de voz que soam mais sombrias do que melancólicas.
E eu tenho que fazer uma observação
aqui: a banda acertou em cheio em colocar Vivi nos vocais após a
saída da vocalista Laiane. Sua voz é mais potente e ela mostrou uma
segurança e técnica muito maiores do que as vocalistas anteriores
da banda. Além de, aparentemente, ela ter melhorado algumas linhas
vocais que originalmente pareciam inseguras e fora de tom, as linhas
feitas especificamente pra sua voz ficaram emocionantes, como na
música Somewhere.
Embora algumas pessoas tenham sentido
falta da segunda guitarra, pessoalmente, eu acho que a formação de
trio funcionou bem, já que mesmo nas partes mais melódicas, o baixo
segurou bem o peso, lembrando também o problema na equalização da
guitarra que mencionei anteriormente. As meninas fizeram uma ótima
performance, tecnicamente superior e mais coesa do que o material já
gravado, fruto da experiência que elas vêm ganhando através dos
shows que fizeram ao longo dos últimos meses. Tocaram, além das
duas faixas do EP The Awakening of the Spirit, mais três faixas
ainda não gravadas mais uma intro.
Resumindo: pra quem curte um Death Doom
mais tradicional, na linha noventista e que, como eu, não são
chegados nas bandas de Gothic Doom na linha do Draconian, pode
conferir sem medo que o som da Mortarium é muito bom.
Setlist:
1 - Memories (Intro)
2 - Blue
3 - My Distress
4 - Somewhere
5 - The Awakening of the Spirit
6 - Celebrate Eternity
HellLight:
Pra fechar o evento, tivemos a banda
que, hoje, é provavelmente a maior representante do Doom Metal
nacional, a HellLight. Tendo aberto os dois últimos shows da banda
Therion em SP, vêm conseguindo bastante destaque com seu disco mais
recente, ...And Then, The Light Of Consciousness Became Hell e o EP The Light that Brought Darkness (lançados pela russa Solitude Recs).
A HellLight é uma daquelas bandas que
consegue soar ainda mais intensa e pesada ao vivo. Os teclados
(executados ao vivo pela Cássia) são muito bem encaixados e nunca
se sobrepõem ao peso do som a menos que a música peça por isso,
dando um clima melancólico, triste, à música. Composta por músicos
bastante experientes, a apresentação da banda foi impecável, mas
semelhante à sua apresentação anterior, no Doom Fest de São José
dos Campos no início do ano, com o mesmo setlist, mudando apenas a
ordem de duas músicas.
De diferente, fizeram a estréia de seu
novo baterista, Evandro Camellini, que mesmo tendo se juntado à
banda apenas dois dias antes do show em meio a problemas pessoais,
levou sua parte com precisão. Também outra coisa a se destacar é o
quanto o vocalista Fábio de Paula vem evoluindo nos vocais limpos,
mais potentes e tecnicamente superiores ao que ouvi em gravações
recentes e no Doom Fest. Seus vocais seguem a linha do Epic Doom e,
com certeza, se tornaram uma característica marcante e que os
distingue de outras bandas Funeral. Fábio cantou a parte final de
Funeral Doom sem dificuldades, feito que não é pra vocalistas
medianos.
Os problemas no som das guitarras
persistiram durante a apresentação da HellLight, sendo que foi o
baixo do Alexandre Vida o responsável a tornar discerníveis alguns
riffs. A apresentação foi bastante climática e a banda tocou por
cerca de uma hora, encerrando seu set com Deep Siderial Silence, uma longa viagem sonora que também encerrou também o Eclipse Doom Festival
V.
Setlist:
1 - Marche Funebre
2 - The Light that Brought Darkness
3 - Afterlife
4 - Funeral Doom
5 - Deep Siderial Silence
Embora o Manifesto não estivesse
lotado, o público compareceu em número muito superior ao do Doom
Fest. Um sinal de que a cena Doom Metal esteja talvez, finalmente,
começando a se unir e crescer. Esperemos que essa iniciativa sirva
pra que outras como ela surjam. O público existe, resta aos
produtores arriscarem e alcançarem esse público, e a ele,
comparecer.
Confira videos das apresentações na página do Eclipse no Facebook:
Fotos por Pierre Cortes:
http://pierrecortes.blogspot.com.br/
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Augusto (V) - O Mito da Caverna |
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Vivi Alves (V, B) - Mortarium |
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Alexandre Vida (B) - HellLight |
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Fábio de Paula (V, G) - HellLight |